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  • Dora Ghelman

O ar que se respira




Pensei em escrever sobre o último final de semana.

Dias de muitos acontecimentos tensos na vida de muitos brasileiros, né?

Final da Libertadores.

Segundo turno das eleições.

Mas achei que não fazia muito sentido trazer essa tensão pra cá.

Já basta o que passei nos últimos tempos.

Depois, pensei em falar sobre o homem que vi bater em um catador que estava parado no sinal, ontem, a caminho da votação.

Do nada. Um soco.

Do nada. Agressão.

Do nada.

Mas aí, pensei que isso me levaria a falar sobre política novamente.

E sobre como as pessoas estão cada vez mais agressivas.

E à flor da pele.

E mostrando as suas verdadeiras naturezas.

Sem vergonhas.

Os monstros estão saindo dos armários.

E sobre como o “mito” aflora essa violência nas pessoas.

O que me leva a pensar em como não consegui reagir.

Fiquei culpada por não conseguir defender o catador.

Mas o medo do homem estar armado era tão grande, que não consegui reagir.

Fiquei parada.

Lembrei da deputada que apontou uma arma para um homem negro no meio da rua.

É isso que queremos para o futuro do Brasil?

Enfim, desisti de falar sobre isso.

Foi então que lembrei de quando fiz meu curso de mergulho, há uns bons anos.

Lembro que meu pai dizia que eu quase não consumia o ar do meu tanque embaixo d’água.

Acho que era porque eu conseguia me manter calma, então não aumentava a minha frequência cardíaca e nem a da minha respiração.

E, realmente, eu sempre me mantive muito calma lá embaixo.

Vendo a imensidão azul.

Os corais.

Os peixes.

Observando como eles interagiam.

O barulho das bolhas subindo, dos estalos que os corais faziam, a respiração estilo Darth Vader.

Ontem, quando terminou a contagem de votos, a primeira coisa que falei foi: “estou voltando a respirar”.

Foi aí que parei por uns segundos.

Eu não tinha percebido que havia ficado sem respirar até então.

Mas havia.

Estou há anos sem respirar.

Eu, que sempre consegui controlar minha respiração, estava há anos sem respirar.

E só percebi quando voltei.

Ontem.

Passei a noite em claro percebendo minha respiração.

Só escutando.

Não deu pra fugir do assunto de política.

Mas é que foram anos de angústia.

Anos de descaso com a saúde.

Com a cultura.

Com a educação.

Com a fome.

Com a Amazônia.

Com as minorias.

Não consigo falar sobre a pandemia.

Isso por si só já me deixa completamente sem ar.

Uma pandemia que afetou as vias aéreas de milhões.

Só de pensar.

Me angustia.

E me deixa sem ar.

Ontem eu voltei a respirar.

Olha, não estou aqui dizendo que o Lula é o salvador da pátria.

Não é.

Não estou dizendo que ele seja isento de “pecados”.

Não é.

Mas são dois pesos e duas medidas.

Não dá pra comparar um com o outro.

É impossível.

A vitória do Lula nos trás esperança.

Esperança por dias melhores.

Peço por quatro anos em que possamos respirar novos ares.

Peço que possamos viver uma democracia em que tenhamos o direito de cobrar por mudanças.

Lutar pelas mudanças que estamos gritando há quatro anos.

E cobrar para que elas sejam feitas.

Em que possamos ser livres.

Que sejam quatro anos de amor.

Só isso.

Não sei se sei finalizar esse texto.

Porque a verdade é que não sei se sei falar sobre política.

Por isso não queria falar sobre isso aqui.

Mas como disse, vivemos dias em que é inevitável falar sobre.

Precisamos falar sobre.

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