- Dora Ghelman
A prisão em que vivemos

Em janeiro de 2019, eu pesava 53kg.
Em setembro de 2020, eu pesava 62kg.
Em setembro de 2021, eu pesava 66kg.
Em junho de 2022, eu pesava 52kg.
Hoje, peso 56kg.
Mais de três anos entre a primeira frase e a última. Muita oscilação, né?
Em 2019 eu me achava gorda, acreditam?
Eu estava (e ainda estou) obviamente magra, mas ainda assim não conseguia ficar satisfeita me olhando no espelho.
Tinha roupas separadas pra usar “quando perdesse mais 2kg”.
Criava metas e objetivos sobre o que fazer quando chegasse no meu “peso ideal”.
Me condicionava a achar que eu só estaria satisfeita quando chegasse nesse tal peso.
Hoje, não sei se me sinto mais livre.
Um dia desses vi um post no instagram que me deixou bastante chocada.
O post falava sobre como tal pessoa havia chegado no peso ideal e estava linda de morrer.
Ok, ela chegou no peso ideal para ela, né? Ou peso ideal para o mundo?
O que é o peso ideal?
O que é “padrão de beleza” para você? Ser magra? Ser gordinha? Ser musa fitness?
Muitas vezes durante o dia me pegava pensando: “Cara, queria ter o corpo de tal pessoa”.
Ou então: “Queria tanto poder comer sem precisar engordar”.
Ou até mesmo: “Para fulana de tal tudo é muito fácil porque ela come o que quer e depois se joga numa drenagem”.
Cara...
Que coisas horríveis de se pensar durante o dia, né?
Quanta energia negativa na cabeça em um dia comum.
Por que hoje em dia tudo gira em torno da nossa imagem?
Por que preciso estar com o “corpo perfeito”?
Que prisão é essa em que vivemos?
Que tal a gente passar a nos aceitar como realmente somos?
Não vou ser hipócrita aqui e dizer que me sinto completamente confortável com o meu corpo.
Isso é mentira.
Estou num processo.
Hoje estou fisicamente mais saudável do que em 2019.
Mesmo estando praticamente com o mesmo peso (uns quilos a mais somente), estou melhor.
Mesmo quando pesava 66kg, era mais saudável do que em 2019.
Estou fazendo mais exercícios, me alimentando melhor, com mais qualidade.
A pressão estética sempre esteve muito presente no meu dia a dia.
Como disse, quando pesava 53kg em 2019, não me achava bonita nem magra o suficiente.
Depois entendi que minha saúde estava precisando de um pouco mais de atenção e comecei a cuidar mais de mim mesma e tentar ser menos dura comigo.
O resultado disso foram 9kg a mais.
Fiquei triste? Fiquei.
Fiquei angustiada porque tinha engordado? Fiquei.
Mas ao mesmo tempo fiquei feliz porque estava me cuidando melhor, me amando mais, me dando mais carinho.
Saí daquele lugar de que precisava estar muito magra e muito sarada para ser feliz.
Mas ao mesmo tempo me vi no meio de uma questão interna: será que eu estava mesmo feliz e confortável?
Eu saí de um lugar de pressão estética mas entrei em um outro.
O lugar do discurso empoderado de aceitação como desculpa para a minha própria insatisfação com o meu corpo.
Eu não estava feliz.
Ok, estava mais saudável com os 9kg a mais.
Mas não estava feliz.
Não me achava bonita quando me olhava no espelho.
É muito importante se amar e amar o seu corpo, cuidar dele.
Mas mesmo estando saudável, eu não amava o meu corpo.
Eu sentia que ficaria mais confortável em mim mesma se estivesse mais magra.
E aí está o dilema: como posso me aceitar do jeito que sou e ao mesmo tempo querer estar mais magra?
Isso não vai contra o conceito de aceitação?
Esses discursos não são teoricamente contraditórios?
Entendi que não.
Me aceitar é me amar do jeito que eu me sinto mais confortável em mim mesma.
Então emagreci de novo.
Com exercícios, com acompanhamento médico e nutricional, com cuidados.
Engordei de novo? Sim.
Estou nervosa novamente? Sim.
Esse lance de pressão estética é uma montanha-russa de emoções.
Como disse, é um processo.
Olha, a questão aqui não é fazer um juízo de valor sobre pesos e medidas.
A questão aqui é incentivar e falar sobre a liberdade de fazer e ser o que você quiser.
Quer fazer dieta e emagrecer 5kg? Tudo bem!
Quer comer o que der na telha e não se importar com balança? Tudo bem!
Quer fazer exercício 8 vezes por semana pra manter um corpo mais fitness? Tudo bem!
De novo, não é sobre o que é certo/errado.
Não existe isso.
É sobre a nossa liberdade.
Vivemos numa prisão estética muito muito forte.
Vamos nos libertar juntos?